28/02/08

"PAI" AMÉRICO - UM HOMEM DE DEUS


___Por casualidade ou por força do destino, estive presente nos funerais do "Pai Américo", o notável Sacerdote que fundou a mais que conhecida "Casa do Gaiato", ou a Obra da Rua, sediada em Paço de Sousa mas com extensões em diversas partes do País e de África. Aconteceu estar em Paço de Sousa em 1956 e as pessoas com quem estava terem resolvido prestar homenagem a um Homem bom, que se haviam habituado a vêr quando ele, com os seus óculos de aros redondos, cabelo curtinho, batina já puída pelos anos, pedia ajuda para os "seus rapazes".
___O Padre Américo Monteiro de Aguiar era natural de Galegos, Penafiel, onde nascera em 23 de Outubro de 1887. Passaram 52 anos sobre a morte do Padre Américo, resultante de um trágico acidente de viação. Vinha de Braga, onde estava a ser eregida a sua obra final: o Calvário, que destinava à assistência de doentes terminais. A viatura em que seguia, numa boleia de um casal amigo da Obra da Rua, sofreu um despiste... e apenas o bondoso Eclesiástico sofreu danos... e a morte. Logo se disse ter o Senhor chamado o Pai Américo à Sua presença, porque sabia quanto ele estava cansado da vida preenchida que mantinha na terra. Para atestar a sua predilecção pelos mais desfavorecidos da sorte, criou a Obra do Gaiato, o Património dos Pobres e o Calvário.
----Uma frase do Padre Américo ficou como uma divisa para a eternidade: "NÃO HÁ RAPAZES MAUS!". Era um Homem de Deus, providencial como apenas ele o poderia ter sido para haver um destino de esperança a aguardar as crianças deserdadas da sorte. Dizia que a Casa do Gaiato seria a "casa de família para aqueles que não têm família". Aqueles que na Casa do Gaiato foram acolhidos, podem não ter tido o afecto que se poderia exigir dos pais naturais, mas também não foram lançados ao mundo da indiferença. O ex-libris da Casa do Gaiato mostra "UM GAROTO DE BRAÇOS ABERTOS, A PEDIR O AMOR DO PRÓXIMO!", recebeu dos companheiros da Instituição a alcunha de "Quim Mau", não sendo isto um mero acaso. Apenas o sinal indelével de uma grande singularidade se consumou, continuando de pé, apesar das muitas tentativas demasiadamente óbvias para a deitar por terra, acusando a Casa do Gaiato dos mais sinistros propósitos... apenas porque o Pai Américo deixou em herança uma obra dos Rapazes, pelos Rapazes e para os Rapazes... e estes têm merecido o legado do seu Fundador.
----Aquilo que o Padre Américo Aguiar nos transmite, perante a estupidez do Poder, é afinal uma lição para as horas que passam, tecida na largueza mental que exclui a dissolvente questiúncula, no descerramento do coração que postega o agastado sectarismo, e na vontade de agir que rejeita o vício do protesto. A última imagem que tenho do Pai Américo, tirando aquela que me ficou na retina quando baixou à sepultura, é o Padre sorrindo, com um sorriso doce, bondoso, na varanda da Casa de Paço de Sousa. A seu lado viam-se sardinheiras, plantas pobres entre as mais pobres, mas também as que mais resistiam às inclemências do tempo. Recordo a sineta tocando, chamando aqueles "gaiatos" para se sentarem ao redor da mesa, onde a amizade está desde logo servida, mas o jantar estará a chegar.
----E é então que compreendo o alcance daquela divisa: "NÃO HÁ RAPAZES MAUS!"

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