------Quando compulsamos a história Marítima dos Portugueses, na gesta dos "Descobrimentos" que fizeram, somos confrontados com algumas personalidades do mundo da lenda, uns mais conhecidos outro menos, mas figuras usadas para dar mais realce às dificuldades da empresa. É sobre um personagem mítico que hoje pretendo dissertar: O ADAMASTOR! O tal estafermo que houve que levar de vencida para que aqueles bravos que estavam a navegar ao serviço de D. João II levassem por diante as suas importantes missões.
------O Adamastaor é um dos gigantes, filhos da Terra, que se rebelaram contra Zeus. Fulminados por este, ficaram dispersos e reduzidos a meros promontórios, ilhas ou fraguedos. O seu nome surge, certamente, pela primeira vez em Sidónio Apolinário, sendo usado pelo poeta Luis de Camões, n'os Lusíadas - canto V, como o gigante do Cabo das Tormentas (Cabo da Boa Esperança), que afundava as naus, e cuja figura se desfazia em lágrimas, que eram as águas salgadas que banhavam a confluência dos oceanos Atlântico e Índico. O episódio do Adamastor representa, assim, em figuração grandiosa e comovida, a sua oposição à audácia dos navegantes portugueses e a predição da história trágico-marítima que se lhe seguiria. É que para lá do Bojador erguia-se um conjunto de lendas e superstições que a imaginação mitogâmica criara a partir do mundo desconhecido. O marinheiro quatrocentista não podia deixar de sentir o mistério que envolvia tais lendas e cujo medo se transpunha para o Tenebroso cabo.
------À custa de uma experimentação contínua, os argonautas Portugueses aprenderam a recusar esses mitos e chegaram com Bartolomeu Dias ao Cabo da Boa Esperança. antiga fama da impossibilidade de navegar e que lhes abria as portas da Índia. Os mares desse Cabo serviram, muitas vezes, de sepultura a naus e a gentes carregadas de riquezas e de desilusões, como que querendo anunciar as profecias do Adamastor:
-----"C'um tom de voz nos fala horrendo e grosso,/Que parece saír do mar profundo./Arrepiam-se as carnes e o cabelo/ A mim e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo. (V,40). Aqui espero tomar, se não me engano,/De quem me descobriu suma vingança;/ E não se acabará só nisto o dano./ Naufrágios, perdições de toda a sorte,/Que o menor mal de todos seja a morte. (V,44)/ Eu sou aquele oculto e grande cabo/ A quem chamais vós outros Tormentório/."
------Muito se nos dará agora que houvesse um mito Adamastor, quando nos confrontamos com uma quase condenação daqueles que "deram novos mundos ao mundo", que ousaram e "passaram ainda além da Taprobana"... "em perigos e mil guerras esforçados, mais do que o permitia a força humana"... e "entre gente remota edificaram, novos Reinos, que tanto sublimaram".
------Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, e parece que o Adamastor acabou, agora e finalmente, por vencer o querer daqueles heróicos marinheiros que, outrora, o haviam desafiado e subjugado... e até eram gente de Portugal!
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